Conduzido por sensações parei. Parei para pensar no que sentia. Senti que parei. Deixei de sentir...

segunda-feira, janeiro 10, 2005

Hesitação

A criatura caminhava por ruas pejadas de pétalas de flores. O aroma do ar era tão denso e agradável que ele conseguia seguir o trajecto mesmo de olhos fechados.
Caminhou durante anos e anos, sem cessar. Caminhou até que um dia, sem que nada o indiciasse, o odor se refreou. O caminho era agora, aqui e ali, despido, de forma a que se conseguia avistar terra suja.
A criatura hesitou e, pela primeira vez, parou.
Não sabia o que fazer e chorou.
As suas lágrimas elevavam-se, voavam e formavam pequenas poças de tristeza no ar.
E ele olhava em frente e via apenas terra.
Pôs-se em bicos dos pés e tentou ver mais longe...mas não conseguia, porque mais além o que via era apenas o prolongamento do monte que voltava a descer na ignorância dos olhos da criatura...
E sentou-se e criou mentalmente cenários possíveis e impossíveis de mundos impossíveis e possíveis e ficou...e ficou durante anos e anos a pensar...sentado...
Até que um dia, levantou-se e voltou para trás...e, à medida que caminhava, o odor começou a intensificar-se gradualmente...mas tudo era confuso na mente da criatura...
Já não estava habituado ao odor forte de um ar que já não era o dele...
Hesitou novamente, por breves momentos...
E cansou-se de hesitar e parar...
Repetiu os passos de anos anteriores até atingir novamente o ponto onde a terra engolia as pétalas...
Refreou a velocidade do seu passo ligeiramente, consumindo a coragem dos passos que estariam para vir...e caminhou...cheirou a terra...cheirou a vida...e a curiosidade do que estava para além do monte foi sendo combatida com o desvendar dos mundos agora possíveis...antes impossíveis pela hesitação...

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