Conduzido por sensações parei. Parei para pensar no que sentia. Senti que parei. Deixei de sentir...

terça-feira, dezembro 26, 2006

Se naquele verso fui feliz, quero reescrevê-lo...
quero que essa passagem seja a introdução de cada dia do meu diário...
Se naquela música fui feliz, quero voltar a escutá-la...
quero poder manobrar a faixa da vida e manter a melodia...
Se ao contemplar aquele quadro fui feliz, quero fazer parte dele...
quero penetrar nas entranhas de óleos de cores familiares e imortalizar-me entre as pinceladas do destino...
Se naquela estação fui feliz, quero poder manobrar a calvicie das arvores...
quero mediar a temperatura do ar, quero inspirar nuvens e soprar a chuva...
Se naquela praia fui feliz, quero construir a minha casa à beira-mar...
quero escutar as marés e cheirar a sal...
Se naquele corpo fui feliz, quero manter o espelho igual à fotografia da minha memória...
quero copiar o sorriso, os gestos e as palavras dessa imagem...
Se naquela falta de lúcidez fui feliz, quero ser louco...
despir-me de bom senso e caminhar nu entre esgares de semelhantes...
desatentos aos seus momentos de felicidade...
Isto de sentir tem que se lhe diga...
Dá aroma à vida e odor à morte...
Transforma-me numa lebre que corre sem rumo,
Fugindo do rugir do inevitável...
Daquele que se esconde à porta...numa qualquer porta...
E eu, embrulhado no sonho que partilho contigo...
Num qualquer daltonismo expressivo...
Tento construir o puzzle do arco-iris, alinhando-o com o olfacto...

Isto de sentir cria fé no céptico...
Fazendo crer que à noite se edificam as reais vidas que o dia subverte...
e a almofada, que suaviza o pensamento,
adiando o ponto final de uma prosa de fim adiável,
é o cofre dos imundos mundos agrilhoados à manhã seguinte...
E eu, a lebre assustada, corro sobre palavras soltas...
sobre palavras que me devorarão no momento em que o sol morrer...

sexta-feira, dezembro 22, 2006

Esta minha imagem não sou eu...
o espelho mente-me...
ilude-me, traçando com o vapor as brumas das lembranças esquecidas...
o que vejo são partículas de cor, que derretem numa mescla de escuridão...
e o que vejo são mosaicos, que embrulham o quadro contemplado pelos seres sem rosto...sentimentos que escorrem na frieza do objecto usurpador da verdade, perdendo-se no ralo anestésico...
Esta imagem, que corgita o alimento da alma, é o rumor dos caminhos alegremente não percorridos...tristemente esboçados pela vontade...
e o espelho prende-me...
molda os meus gestos, guia-me os membros e usurpa-me a vontade...
controla-me, gerindo os meus movimentos com os cordeis da resignação...
o que vejo são as imagens por ele projectadas...numa eterna mas falsa felicidade...
e o que vejo é a moldura, de um quadro inacabado, escrever numa exclamação as reticências da minha existência...

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